terça-feira, 26 de julho de 2016

JOACHIM LÖW: COM QUE ROUPA?



ref. 20 de jul. 2014
O sambista Noel Rosa, em 1929, compôs o arranjadíssimo samba "Com que roupa?". Era o malandro se aprumando. Tentando se reabilitar. Abrindo mão dos velhos vícios e a procura de um caminho.
Creio que os amigos leitores ao lerem o título deste texto, devam estar se perguntando o que há em comum entre Joachim Löw e esse samba do velho Noel.
Olha. Vivo de frases metafóricas. Até mesmo hiperbólicas.
Joachim Löw, assim como o velho Noel, sabem que o malandro só é malandro se tem o domínio da situação.
Durante quarenta e cinco dias, vi uma avalanche de esperança verde-amarela povoando ruas e os aparelhos de televisão.
Torcer não era mais um ato consciente, mas sim, um hit. Uma modinha de estação.
A melhor peruca. A camisa mais colorida. A pose do Fantástico.
Meu Deus.
Onde foi parar o velho e bom futebol?
Cadê a malandragem?
Tudo tão politicamente correto.
Hinos.
Censuras às vaias.
E os grandes pique-niques nas arquibancadas.
No campo.
Ah, o campo. O palco do malandro. Do futebolista por excelência.
Estava vazio.
O que via?
Cavalheiros. Homens corteses, dedurando uma falta cavada. concordando com o jornalistas moralistas.
Mas Deus é bom.
Nos deu Joachim Löw.
Isso mesmo.
Deus no auge de sua infinita bondade nos deu uma alemão que nos reapresentou à malandragem. Malandragem gritada em alemão na boca de um Thomas Müller. Em suas cavadinhas.
Um alemão que nos ensinou que malandro que é malandro, domina jogo. Toca a bola. Cai no campo. Cai não. Cava.
Enquanto isso, os cavalheiros do futebol ficam se dedurando ao árbitro.
Era uma malandragem importada, mas com a qualidade MADE IN BRASIL.
Foi uma epidemia moralista por longos quarenta e cinco dias.
De uma hora para outra todos queriam ser honestos em campo.
No futebol isso é impossível.
Qualquer um sabe disso.
Nos campos de peladas.
Nos campeonatos.
Nos amistosos.
Foi uma delicadeza geral.
Mas veio o trauma. 
A imprensa se calou. 
E a ordem natural das coisas voltaram.
Caímos em um choque de realidade.
Noel Rosa e Joachim Löw nos ensinaram uma coisa em comum. O futebol e o malandro se reinventam, só há bom futebol se este vier somado a boa malandragem.

BUSCAS FREUDIANAS



ref. 14 de set. de 2014 (um dia de luto)


Se estivesse vivo, o grande Sigmund Freud seria um ávido estudioso do futebol. As paixões decorrentes deste esporte tão misterioso e confuso, o intrigariam. E o mestre no auge de sua sabedoria diria:
É confuso por que é simples.
O pai da psicanálise se esbaldaria nas contradições geradas dentro de uma mesma partida. Dentro de um mesmo time.
As oscilações entre o êxtase e a tormenta.
O choro.
A vergonha.
A ira.
Tentaria entender os quadros mentais que se projetam em uma partida, sua estrutura. Sua lógica.
Lançaria-se a questões que tentariam explicar a perfeição e a apatia?
Perguntas minhas, que tento transferir a alguém mais competente.
Confesso a você meu caro, que mesmo me aventurando nessas leituras, não consigo respostas.
Há duas semanas, esforço-me em amadurecer uma reflexão digna da perfeição tática ocorrida na chácara da Graciosa. Na situação, ganhamos por 8 a 4. Foi um desfile de belos passes. Triangulações. A geometria do campo foi redesenhada por nossa equipe.
Retângulos.
Triângulos.
Circunferências.
A mágica matemática em plena ação.
A Matemática, é a ciência mais popular calculada e reinventada por boleiros.
Reinventamos o vento.
Isso mesmo. O vento.
Foi o que restou a nossos adversários.
Que humilhados sucumbiram.
Naquela partida havia frieza.
A frieza antagoniza com suas primas-irmãs apatia e arrogância.
Como a lenda grega de Hércules contra Hidra, todas habitam um mesmo corpo, uma mesma mente e são filhas da vaidade.
Se a frieza vem acompanhada da arrogância, não importa quantas vezes corte a cabeça desta Hidra, ele renascerá com outras duas.
A arrogância quando absorvida pela sua irmã apatia, leva o herói ao fracasso.
Dramático.
Mas assim é o futebol.
É uma tragédia, no sentido grego do termo.
O esporte das multidões.
Interfere em casamentos. Promove lutas homéricas. E frustrações abissais.
O amor intenso causa dor maior que traição ou até mesmo a morte.
E é do luto que escrevo essas linhas.
Hoje publicaria uma página em branco, tamanho meu luto.
Mas, o futebol, como diria Albert Camus, molda o homem, revela o seu caráter.
Sábias palavras, vindas de um homem que se dedicou à literatura e a posição mais solitária do campo: o goleiro.
E é dele que por justiça devo narrar a tragédia ocorrida nesta tarde.
O goleiro luta.
Luta sozinho.
Quando erra há a queda do mundo.
É gol.
Mas é uma luta travada por um homem só.
É pelos olhos do goleiro que medimos a frustração de um time.
E como o meu goleiro estava encabulado ao término da partida de hoje.
Foi o nosso melhor atleta em campo. Evitou que a humilhação virasse massacre.
Defendeu tudo que pode.
Contra um.
Contra dois.
Contra três. 
Contra quatro.
São as dores no corpo deste combatente solitário que denunciam a apatia de seus companheiros.
Foi o jogo de um goleiro contra um time.
Um jogo de um time só.
Simplesmente não jogamos, como prefiro dizer: não encaixamos.
Foi uma sapatada.
Humilhante.
Uma bela sapatada.
E voltando a Freud.
Lanço-lhe, caro doutor, uma pergunta pós morte. Para ecoar no além:
Como pode a perfeição e a mediocridade serem tão próximas?

segunda-feira, 25 de julho de 2016

GARRAFADA

25 de jul. de 2016


Milagre bom.
É milagre que cura.
É tanta lesão que nos últimos anos acendi vela até para santo de terceiro escalão.
Boleiro é assim. Diz que cura. Faz.
De mandinga a garrafada já experimentei de tudo.
Pimenta em carteira.
Patuá no bolso ou no pescoço.
Fita de  Nosso Senhor do Bonfim e de Nossa Senhora Aparecida no pulso.
Fumo em músculo estirado.
Arnica então. Nem se fala.
Até água benta na reza de pastor já provei.
Uma festa de ervas e rezas.
Mas lesão é que nem erva daninha.
Brota.
Arruma o coxa. Estraga a panturrilha.
E as receitas? 
Essas só aumentam.
Assim como as rezas.
De terreiro em terreiro. A que me surpreendeu veio da beira do campo.
De uma jovem senhora solidária. Daquelas que entendem o coração do boleiro. Sabe de suas paixões e dores.
Vendo-me abatido na margem do campo.
Uniformizado, ainda calçado com as chuteiras.
Indagou-me: "É joelho"
Disse: "Não, é tornozelo".
Continuou: "Já tentou arnica"
Desanimado: "Sim".
"- Hum!
Mas sabe que é seu moço, arnica sozinha não resolve".
Antes que disse qualquer coisa a mesma continuou:
"Tá vendo aquele rapaz ali dentro do campo?  O da camisa 10.
É meu marido. 
Tava condenado por todo médico que lhe examinou.
Tinha médico que dizia: É cirurgia e muita fisioterapia para voltar a andar legal. Futebol. Já era.
Olha como ele corre.
E tava condenado.
Tiraram umas duas seringas de sangue do joelho dele.
Tava condenado.
Quem vê ele correndo.
Não acredita.
Mas óia. 
Quem curou meu marido. Primeiramente foi a nossa fé em Deus e Nossa Senhora.
Mas acima de tudo. 
Foi a garrafa".
Mais que depressa, lhe peguntei que garrafada é essa.
Falou baixinho.
"- Foi um pai de santo forte. Dos bons.
O segredo da garrafada está na erva que vinha junto com a Arnica".
Mas que erva é essa? 
A prova do milagre estava voando em campo.
Custei a acreditar que aquele homem tivesse algum tipo de lesão.
"- Erva do capeta"
Praticamente sussurrou.
Mas onde encontro?
"-Encontra não. É proibida"
Mas o que é erva do capeta.
"-  A de dar tapa na macaca.
O pai de santo perguntou quem em nossa casa fumava o cigarrinho do diabo. Fiquei até ofendida, porque lá em casa somos todos de Deus. Mas tinha o meu cunhado. 
Esse mais que depressa foi num amigo dele e trouxe um pouquinho da Erva. 
Tá lá tiro e queda". 
E joga que é uma beleza.

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quinta-feira, 21 de julho de 2016

TEMPOS DE VÁRZEA

Fonte: http://papodevarzea.blogosfera.uol.com.br/ 

ref. 28 de mar. 2015
Quando se escuta a expressão Várzea, a primeira coisa que vem à mente é o futebol pegado.
Muita malandragem.
Intimidação. 
Um futebol até feio. Mas romântico.
As lembranças são muitas. 
Desde os gramados que eram um misto de terra e "grama". Os barrancos ao lado do campo, que volta e meia algum jogador ousado era arremessado ribanceira abaixo. Os córregos sumidores de bola.
Mas o mais marcante e saudoso, era a torcida em cima da linha, marcando o ponta, juntinho. 
Em uma linha que se esforçava para ser uma reta. Marcada no cal seco.
Não era raro, ver um tapa na bola em alguma reposição de lateral. Os mais ousados se arriscavam em uma chinela.
Aliás, quantos chinelos no campo.
Os elogios?
Ah, os elogios, como esses eram criativos.
Desde os mais simples, "você não vai sair vivo daqui não", até os fantasiosos "aqui primo tudo é família, mexeu, morreu".
As "Marias Alambrados" xingando incessantemente.
Os tiozinhos cornetas, reclamando da falta de qualidade do futebol atual.
Isso sim era paixão.
Em Londrina o futebol ficou muito chato. O folclórico Amadorzão, hoje está com uma estrutura que beira a um semi-profissionalismo. O Ruralzão, campeonato dos bundas sujas, pés pesados e brutos, virou uma sucursal de categorias de base. 
O Interbairros?
Esse morreu.
Para os boleiros só restam os clubes.
Um futebol sandalinha, que adocica machos.
O boleiro virou um chato.
Não bate. E odeia apanhar.
Faltam braços esticados.
Camisas puxadas.
Falta sangue.
O futebol está muito limpo.
Cadê a Várzea?
Simbolicamente morreu.
Morreu com o campo do Sebastião de Mello.
O glorioso campo do Mello, como era conhecido.
Por onde passaram todos os boleiros da Zona Norte.
Pelo menos os da minha geração.
Hoje tive um pequeno lampejo desse futebol que não existe mais.
Juiz mal intencionado.
Expulsando até por pensamento.
Torcida ameaçando, xingando.
E pancadaria.
Muita pancadaria em campo.
Até senti o cheiro da grama misturada ao pó da terra dos campos em que cresci.
Foi um bom jogo.
Corrido.

SARAVÁ PRETO VÉIO: PIMENTA NA CARTEIRA E BOLA NA REDE




ref. 16 de ago. 2015
Diversão de boleiro é coisa séria.
Talvez essa frase resuma o que penso eu e muitos outros boleiros da cidade.
A gente não sabe brincar.
Sangrar. Torcer joelhos e tornozelos, fazem parte de nossas brincadeiras em campo. 

Quem está de fora não entende. E nunca entenderá.
Quando perdemos, a cerveja fica mais amarga. Para ser sincero, nem desce.
Falta ânimo para a semana.
Entre o jogo perdido e o próximo, o tempo se arrasta. Vai mais de vagar.
Perdemos o sono, e com ele o bom humor.
Dia de derrota não tem piada.
E quando é time bom, o drama aumenta.
Ficamos sem saber para onde correr.
Alguns chegaram a cogitar oração.
Outros raça.
Cada um interpreta a fase com as forças que tem.
Mas insisto.

Má fase só passa com muito trabalho e bola na rede.
Quando a fase está feia, chute de bico é letra.
Carrinho é passe de mestre.
Mas é de mandinga em mandinga que vive o boleiro.
Não abro mão da pimenta.
Nem da reza forte.
Nem de algumas pegadas doídas.
Creio que todos estávamos com pimenta na carteira.
Um ou outro, creio que foi em culto no meio de semana.
O cara rezou tanto que nem xingou em campo.
Mas jogou. E como jogou!
O time jogou muito.
Bateu saudades da invencibilidade. Do time organizado em campo.
Aguerrido.
Afim de jogo. E pronto para o jogo.
Foram oito gols, poderiam ter sido doze.
Treze.
Criamos e marcamos.
Voltamos.

domingo, 10 de julho de 2016

E o frango soltou o "rabo"


10 de julho de 2016

O futebol e seus bichos. É uma festa, tem jacaré, gato, peixinho, coruja e o famoso frango.
A criatura galinácea, de todos, é a indesejada. Quando em campo, costuma fazer seu ninho na área. 
Escuta-se ao longe o seu cocoricocó.
Quando a bola passa. É pena pra todo lado. Uma correria geral.
Geralmente, essa criatura só se faz perceber no silêncio. 
Adora sair em segurança.
Ai, a coisa está feita.
Chute despretensioso e... Cococricocó.
Eis que passa o galináceo.
O pobre goleiro?
Cabisbaixo com as penas de seu "rabo" nas mãos.
Enquanto isso, a ave desmiolada salta e gira alucinadamente emaranhada na rede.
Cococricocó.
Cococricocó.
Vida de goleiro não é fácil.


sexta-feira, 1 de julho de 2016

QUANDO UMA ESTRELA BRILHA

Terceiro gol do Brasil contra a Suécia, na goleada de 7 x 1 em pleno Maracanã, Copada do Mundo de 1950 (gol de Chico). Fotografia: Folhapress.


29 de junho de 2015
QUANDO UMA ESTRELA BRILHA
Há alguns meses uma estrela andava apagada, quase sem luz.
De um futebol altamente competitivo, passou a fazer jogos modestos, aceitando o papel de coadjuvante nas partidas. Ora reclamando de sua solidão em campo. Ora baixando a cabeça frente a má fase.
Um isolamento imposto. Coisa do futebol e de suas panelas.
Mas estrelas tem brilho próprio e não se apagam facilmente.
Suave em campo, é um jogador que me lembra em muito o jeito de jogar do Danilo (do meu amado Corinthians). Esconde a bola. Parece lento. Inteligente.
E acima de tudo, mortal vindo do fundo.
Talvez seja isso.
Talvez a resposta para esse período sem luz esteja no fundo.
Um fundo que por algum tempo deixamos de usar.
Então, chego a conclusão que o brilho dessa estrela não havia se apagado, mas sim neutralizado pelo esquecimento.
Neste fim de semana quis brilhar, e brilhou.
Aceso, fez dois gols.
Com a perna esquerda, sua perna ruim, Encontrou a trave. Lance que lhe tirou o sono.
Sempre silencioso, do fundo, criou,
uma,
duas,
três, uma infinita série de condições de gol.
Voltou a brilhar, a irradiar o campo.
Dizem que estrelas brilham por muito tempo.
Assim espero.

O IMARCÁVEL MARCA. COMO MARCA



23 de agosto de 2015

É um jogo de palavras, mas define o que a lógica muitas vezes não dá conta.
No futebol "marcar" é uma palava de duplo sentido. Ora ofensiva. Ora defensiva.
É um verbo conjugado durante a partida, por todos.
É tão intenso que na oração de entrada de campo, o Pai Nosso poderia até ser modificado por "(..) Pai Nosso que estais no Céu MARCAI por nós jogadores".
Não veria problema nisso.
Porém, o imarcável é algo espetacular.
É o surreal futebolístico. 
A composição dos personagens folclóricos dos gramados.
Imarcáveis são DEMÔNIOS, não nego.
Pelo menos para nós zagueiros.
Criaturas imprevisíveis, vivem do mais puro improviso. De lampejos de genialidade.
Todo imarcável deveria virar verbo.
Ser ensinado nas escolinhas de futebol.
Imaginem uma aula de conjugação do verbo Edmundo. 
O jovens zagueiros, todos ainda em sua puberdade, fazendo cara de maus e gritando:
Eu Edmundo, vou de carrinho
Tu Edmundo, irás de voadora
Ele Edmundo, dobra comigo para o cara não escapar.
Seria hilário. 
Haveriam outros verbos como Edílson Capetinha, Neymar, Messi, Zidani, Ronaldo Fenômeno entre tantos outros.
Olhando o gramado por esse ângulo, seria justo definir então, que em times de futebol existem jogadores e jogadores, como filosofava o grande Vicente Mateus. Todos são importantes em suas funções. É inegável isso. Mas o senso de justiça me obriga a dizer que há jogadores que estão jogando um pouco mais que os outros.
Volto-me a minha realidade. Aos meus campos.
Pois essas criaturas desfilam pela várzea.
Tiram sono de zagueiros.
Todos os domingos divido o campo como desses fenômenos. 
Como se não bastasse ser imarcável, nosso centroavante marca e como marca.
Não dá para brincar na sua frente.
É um atleta completo, adepto do futebol moderno.
Moderno mesmo. Do tipo de atleta que Tite e Guardiola gostariam de ter. Pois no futebol moderno é assim, a marcação começa no ataque. Não há espaço para atletas displicentes ou morosos.
Centroavante bom. 
Marca. 
Sem preguiça. Sem reclamar. Tem que marcar.
Define o jogo e ainda recompõe na saída adversária.
Assim é Marcão. 
Está com uma estrela de dar inveja ao astro rei.
Dribla para os dois lados.
É rápido e habilidoso.
Está em uma fase tão boa que se dá ao luxo de chutar ao gol de forma despretensiosa. Quase que esnobando o guarda metas adversário.
São chutes mentirosos. Cheios de efeito.
De uma leveza que dá gosto de ver.
Hoje fez cinco.
E não esgotou o repertório.
Estava modesto.
Fez gols simples.
De centroavante trombador mesmo.
Nada de bicicletas ou voleios.
Sinceramente. 
Tive pena do zagueiro adversário. Que mais baixo, ousava em querer procurar o corpo.
Falta de inteligência custa caro.
Pelo menos uns três gols de giro.
Hoje, parafraseando o já citado Vicente Mateus,
Marcão no ELETROGE F C é invendável e imprestável.
Complemento a frase dizendo, IMARCÁVEL.