sábado, 28 de abril de 2018

O primeiro gol


fonte: http://www.ibom.com.br/exibeNoticias.php?id=183 (Fabiano Oliveira)

Seus olhos sempre brilhantes, naquele momento abriam-se na intensidade do feito.
Lentamente expandiram-se no rosto como que espantados.
Sua boca estava entrecerrada com seus próprios dentes que apreensivos agrediam-lhe a carne.
Foram longos dois ou três segundos.
Entre o momento em que a bola dividida sobrou-lhe na entrada da área e a tomada de decisão.
Decisão certeira.
De treino.
Tal como repetido, errado e acertado tantas vezes.
Pisar e chutar.
Pisou. Sapateou na troca de pernas.
E chutou.
Chutou no cantinho.
O goleiro até foi. Esticou o braço. Os olhos. Os dedos e a alma.
Mas não alcançou.
Foi porque tem que ir e pronto.
A bola bateu caprichosamente no pé da trave.
Para o desespero do goleiro, entrou vagarosa.
Despretensiosa.
Quanto ao jovem artilheiro?
Esse, sem saber o que fazer, apenas observou.
Com os olhos arregalados e um sorriso surpreso no rosto.
O jogo já estava ganho.
Sequer tinha noção disso.
Apenas contemplou por segundos o feito.
E quando a bola determinou seu trajeto. Euforicamente se segurou.
Mesmo com os gritos de seu nome que vinham da arquibancada.
Virou-se para seu próprio campo.
Quando deu por si, já o abraçavam.
Foi uma experiência única. Foram seus primeiros abraços em equipe. Naquele momento, pelo menos naquele momento, estava inserido no grupo.
Pelo menos naquele momento, não era o menino lento e desajeitado, deixado no banco de reservas, aos caprichos do esquecimento do treinador.
Por alguns segundos todos o viram.










quarta-feira, 4 de abril de 2018

Márcio, você viu

Rodrigo, o zagueiro da DEDADA deixa a Ponte Preta

Os gritos eram fortes
"Márcio você  viu. Márcio, você viu"
O jovem estava transfigurado.
Contido inicialmente por dois, depois três jogadores. E todos aqueles dispostos a segura-lo. Esbaforindo palavrões, lutava contra braços e corpos que se colocavam a sua frente.
Queria a alma de nosso lateral, que impassível, apenas levantava o braço em sinal de que não fez nada.
Uma atitude incrível de quem acabara de receber um chute pelas costas.
Era um chora daqui, que cobro dali.
todos pendurados no Márcio.
"Vai ter que ter punição".
"Como assim?"
O que deu nesse moleque, que continuava a gritar em direção ao árbitro.
"Márcio, você viu".
"Você viu sim".
E Márcio, esse era o nome do árbitro. Um negro corpulento, alto, de uma calma invejável. Com o semblante dos justos, procurava no bolso esquerdo de sua camisa o cartão. Faria justiça.
Tamanha covardia não poderia deixar de ser penalizada.
Por um momento, tomou o vermelho em mãos.
Mas, antes de levantá-lo, como que assaltado por uma dúvida.
Eis que levanta o azul.
Agora, éramos nós os indignados.
"Poxa Márcio, foi agressão. Você viu."
"No futebol pode tudo. Mas chutar assim, já é covardia. Azul está barato"
Impassível, com um toco de lápis em sua mão direita apenas anotava.
Sequer nos deu atenção. E para piorar, disse:
"Volta em cinco. Faltam seis. volta em cinco".
Na saída de campo, o jovem que passara por mim, repetia,
"Um minuto, ah! Eu pego ele".
Sequer sentou. Amparado por amigos tentava justificar sua atitude.
Não se conteve.
Estava em cólera.
Xingava à beira do campo. Incrédulo e revoltado com a pena atribuída a seu destempero. E repetia para si
"Eu pego ele, me põe que eu pego ele".
Em um plano que seria o revide mais rápido da história do futebol. Passaram mil estratégias. Todas fadadas ao peso do tempo.
E a vítima?
Afastado do centro da confusão, apenas ria enquanto era fitado por aquele olhar sedento de vingança.
O jovem não se conteve.
Aquilo era demais.
Humilhante.
De fora do campo, o garoto gritou.
Gritou com fúria.
Com os pulmões cheios.
Como macho ofendido.
Indignado pela cegueira de todos.
"ELE ENFIOU O DEDO NO MEU CU. NO MEU CU, OUVIU?"