fonte da imagem: http://g1.globo.com/turismo-e-viagem/fotos/2014/06/leitores-enviam-fotos-de-ruas-enfeitadas-para-copa.html
Quarta-feira em dia de jogo de seleção. As ruas estavam
vazias. Ou praticamente vazias. Transitavam pelas vias alguns poucos
desinformados, e outros, esses que deliberadamente, como réprobos da pátria,
ignoravam os heróis nacionais que em questão de poucas horas entrariam em
campo.
O que se multiplicava pelas esquinas eram vendedores de
camisetas, bandeiras e todo o tipo de souvenir patriótico. Senti-me um
traidor. Mas continuei minha marcha.
As fachadas estavam decoradas. Sinceramente, não muitas. Reflexo
da péssima estreia contra a Suíça.
Em um colégio
ouvia-se o aquece de alunos na organização do grito de possíveis gols
canarinhos. Resisti a tudo. E rumei para o trabalho. Ao estacionar, uma senhora
questionou-me sobre sua bandeira:
- Nossa bandeira está visível.
Disse-lhe que sim.
Continuou:
- Mas está bonita? O que acha?
Ri, e disse-lhe que estava bonita. Bonita e visível.
Perguntava-me como se quisesse confirmar seu voto patriótico.
Fez-me lembrar de minha infância. De minha primeira Copa.
Na escola, pintávamos bandeirinhas em cópias mimeografadas ainda
cheirando a álcool. Não eram copias
qualquer. Havia dizeres. Dizeres de apoio. Frases otimistas que segundo nossas
mentoras, levariam energia positiva aos nossos craques, que em seu heroísmo homérico
confrontariam em campos estrangeiros, inimigos vis.
Lembro-me das bandeiras pintadas com guache nos muros da
escola. Dos jogos de figurinhas nos intervalos. Os gizes coloridos redecoravam o
piso do pátio. Discutíamos avidamente os craques das rodadas. As jogadas. Sempre
observados por olhares curiosos. Pareciam aprender sobre a magia da bola, através
da conversa de meninos. Meninos. Copa era assunto sério.
Era tamanha a euforia, que as zeladoras sempre carrancudas
com nossos deslizes, sequer manifestavam. Ao contrário, assistiam às partidas
no pátio, aplaudiam-nos. Até torciam. Arriscavam
em comentários futebolísticos. Algumas, sensibilizadas pelo momento, trazia-nos
figurinhas.
Em época de Copa, éramos comandados por senhoras. O hino
nacional era executado diariamente. E, em jogos da seleção, cantado a pulmões cheios.
Cheios de ar e esperança. Sentia-me perfilado ao lado de Sócrates, Zico, Edinho
e companhia. Como se tivesse a bola abaixo dos pés.
Era um patriotismo ingênuo. De saias. Cantado e pintado. De
professoras, em sua maioria, senhoras, que nos educavam em um civismo
maternal.
Era um patriotismo cíclico. Que como tal, terminara com as cobranças de pênaltis.
Encerrado na parede francesa.
Adeus às bandeiras.
As fachadas voltaram a sua frieza.
E nós, voltávamos à rotina, na expectativa de que dali há
quatro anos tudo fosse diferente.
E veio 1990.