domingo, 2 de fevereiro de 2020

Jarrão



O futebol de várzea tem seus mistérios e histórias, é recheado de personagens das mais diversas alcunhas. Penso, que na várzea ser chamado pelo nome beira o desrespeito.
São muitos os apelidos que desfilam pelos campos, uma listagem digna de uma taxonomia específica. Boizinho, Peruca, Barriga, Queixada, Vermelho, Bagaça, Sossego, Tiziu, Tyson, Delega, Balão, Buiú, Toddy, Soninho, Miséria, Tonho Preto, e assim se estende a lista por gerações de atletas.
Muitos apelidos acompanham-nos desde a infância. Uma forma de "categorização" do indivíduo, é quase um segundo batismo. Outras são atribuídas tardiamente, e muitas nascem dentro dos campos de futebol ao ponto de nunca saber o nome verdadeiro de alguns jogadores.
Nesse universo de alcunhas, há alguns anos, uma vem tirando o sono de muitos marcadores da cidade, a figura atende por Jarrão.
O nome?
Sabe lá Deus qual. 
Mas falou Jarrão em qualquer região da cidade. Dão até o número de sua chuteira.
Dia de marca-lo, é jogo sem elegância, marcador precavido joga na base da trombada e do chutão. Sem conversa. Qualquer jogador bem informado sabe disso.
É jogo no IAPAR? 
Tem que reforçar a marcação.
E não tem sossego.
Sozinho segura no mínimo dois marcadores.
E o pior, não falta. Sequer dá uma trégua com uma lesão ou outra.
O indivíduo parece que mora no campo.
Quando atrasa, dá para escutar o murmurinho.
O semblante do pessoal fica tenso.

- E ai, ele vem ou não?

Com seus quase dois metros de altura e alguns quilinhos a mais, é um antagonista no sentido pleno da palavra naquilo que se compreende como fisionomia futebolística.
E ai que mora o perigo para os desinformados.
É meio time, e todos sabem disso.
Todos. Companheiros do Amigos do Iapar e os adversários. 
Os que não sabem, ao término das partidas ficam sabendo.
Deu espaço, é gol.
É o rei da área em Londrina.
Sujeito de pouca conversa no campo, caminha sempre de cara fechada. Faz o tipo intimidador. Grande e corpulento, é dono de uma canhota incrível. Conhecedor de seu status, parece entrar em uma bolha quando está no gramado.
Falou Jarrão. Todos já sabemos, lá vem cotovelada, pisão no pé, tapas no peito e muita habilidade com pivôs quase imarcáveis.
Seu jogo, todos conhecem, trava a bola em sua canhota, segura na parede e prepara o pivô.
É um perigo. Quanto mais perto da área, mais letal.
Gosta de jogar de costas.
Poucos gostam tanto.
Em jogo com personagem tão folclórico, todos viramos coadjuvante.Tem-que se criar uma coregrafia para anula-lo, o na pior das hipóteses, diminuir o estrago. 
Chegará um dia que lhe prestarão a devida homenagem, batizarão o campo com o seu nome.
Talvez, até uma placa com o total de gols marcados.


referente a junho de 2014

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