sexta-feira, 10 de abril de 2020

Whatsapp

Lupércio, ex-goleiro da Bratac, Maria Lúcia, Londrina, 2018. Foto: André Camargo


O mundo é online.
Tudo que pretendemos desenvolver passa por páginas, grupos ou redes sociais.
No futebol amador não é diferente. Hoje as equipes nascem e também morrem no Whatsapp.
Sem romantismos. Nada de peneira ou indicações. Sem essa de rachão ou time de amigos.
É pro curtida mesmo.
A publicidade está nos comentários e os likes das redes sociais.
Quer formar um time? Vá para o "Whats".
Mas antes, vasculha as redes sociais, procura o jogador em seu perfil e faz o convite.
Aceitou, adiciona no "Whats".
Com os jogos também não é diferente. sou da época que esses eram marcados pela rádio, que na segunda-feira divulgava os resultados das partidas que agendara.
Hoje não.
Está tudo em grupo.
Em Londrina todas as partidas, nas quatro Ligas da cidade são combinadas online.
Se quiser jogar na cidade, tem que estar conectado.
Tudo é figurinha e status.
Administrador e dirigente até o momento do jogo, não passam de um Avatar.
Atualmente, para garantir os jogos, e estar por dentro da cena, participo de quatro grupos de Whatsapp. Na verdade, são quatro Ligas de futebol, administradas por um ou mais indivíduos.
Esses grupos são verdadeiros Fóruns. É administrador mandando resenha do pós-jogo revelando as rivalidades locais e os desafetos, as fotos dos campos e vídeos das partidas. Fora as bajulações recheadas de falsidade, e o "Deus abençoe todos nós", ou o "aqui todo mundo é irmão", geralmente após uma sessão de bate-boca.
Uns grupos são mais objetivos que outros, os mais organizados, postam lâminas com os escudos das equipes e os resultados, não admitem conversas que destoem disso.
Outros não, lava-se muita roupa suja nestes grupos.
Em meio a brigas, bajulações e ameaças, recentemente, a coisa ganhou novos ares. Imagine o oder de um grupo de Whatsapp. Fechado, os caras falam e fazem o que pensam. Veja o estrago, até presidente elegeram, evitam Blitz, e tudo. O que dirá fritar um jogador.
Foi o que fez um dos dirigentes locais ao postar um áudio de descontentamento.
Era um áudio longo, quase dois minutos de desabafo que encontrou eco.
Desgostoso com a atitude do atleta, o  expôs ao julgamento do grupo. Deu o nome, a apelido e o tipo físico, audíveis até para os mais distraídos.
Estava formado o "tapete" online.
Uma forma de moralizar o futebol amador da cidade.
Era o que dizia.
Aliás, neste momento do áudio já bradava.
Rapidamente surgiram as palminhas.  De todas cores.
Alguns mais empolgados, mandavam figurinhas de apoio.
Eram uns dez envolvidos, mas estava feito.
Um pequeno grupo de diretores de equipes de futebol amador da cidade resolveu dar uma basta ao boleiro sem compromisso.
E o denunciante? Em meio ao coro, continuou. Estava visivelmente indignado com o investimento e a falta de retorno que teve com esse atleta, passou o currículo. Repetiu o nome e CPF do indivíduo.
Era coisa de gente traída. Dava para perceber a mágoa.

- Tratei como um filho. A chuteira estragava em jogo de meio de semana, e lá estava o indivíduo no sábado fazendo pressão para trocar o par.  Ou troca ou não joga. Trocava.

- Dei do bom e do melhor. Todo jogo trazia a família e os amigos para ficarem na piscina.

- Gastamos um monte com o "doce" no final das partidas. E a cerveja?
Tem que ser da boa. Da badalada.  Nada dessas convencionais que os estômagos do garotos são sensíveis.

Sentia-se traído. Era visível isso.
Deu campo.
Chuteira e cerveja.
Até apresentou para os amigos.

- Era para ver se o indivíduo se arrumava melhor no emprego.

Era quase um pai.
E o que ganhou?
Um "valeu", em meio de temporada. Com o time reformulando.
E a contrapartida?
Não teve.
Desabafava. E a cada eco que surgia no grupo, repetia outras várias vezes o nome e o apelido do atleta. Alertava os demais dirigentes sobre suas atitudes.
Em meio a tal situação, o debate ferveu.
E assim seguiram as lamúrias.
O desabafo deu o que falar ao longo da semana. Outros dirigentes, sentido-se seguros e acolhidos começaram a puxar o histórico de muitos atletas de temporada.
Era uma insatisfação só.
E o coro?
Uníssono.
A reclamação estava voltada ao custo-benefício.
Investe-se no jogador. Isso é fato.
Os mais indignados desabafavam.
Foi uma terapia coletiva. Furiosos, reclamavam de tudo. De tudo mesmo.
Um dirigente que até então só visualizava, resolveu improvisar um acordo.

- Vai ter que apresentar currículo.

Silêncio geral no grupo.
De repente, surgiram os "joinhas".
Eram mais de cinquenta.
Muitas carreiras de boleiros estavam se findando naquele momento.
Propôs que jogador que estivesse trocando de clube informasse a origem, e que os dirigentes acertassem entre si a permissão ou não deste jogador disputar uma das Ligas em suas equipes.
Os remelas de chuteira ficaram bravos.
Esses que até então estavam quietos, talvez gozando do desespero alheio. Viram-se prejudicados.

- Como assim? Se trocou é porque está procurando coisa melhor.

Outros propunham meio termos.

- Fritar o jogador é muita crueldade. Ninguém precisa jogar onde não quer. Façamos o seguinte, jogador só muda de clube no final da temporada.

Silêncio no grupo.
De repente, mais de oitenta "joinhas".
Era quase unânime a ideia. Pareciam ter encontrado uma solução.
Pelo menos, até a rodada de sábado,  quando o distinto boleiro foi visto com o uniforme de um dos remelas.
Não deu outra. Rolou foto, áudio e muito xingamento.
Parecia briga de marido ciumento.
O cenário estava montado.
E o boleiro?
Esse não estava nem ai. Jogou e até gol fez.
Foi uma bela estreia.
Tem vídeo.





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